Educação
Postado em 5 de março de 2024 as 18:40:05
Em meio à programação de atividades relacionadas à temática do Dia da Mulher, celebrado em 8 de março, duas palestras foram realizadas nesta terça-feira (5), na Escola Municipal Juiz Dr. Gildásio Castro, localizada no bairro Henriqueta Prates, zona oeste de Vitória da Conquista.
Pela manhã, a equipe do Centro de Referência da Mulher Albertina Vasconcelos (Crav) apresentou aos alunos o tema “O Enfrentamento da Violência Doméstica em nossa Sociedade: Desafios e Avanços”, a cargo da coordenadora de Enfrentamento à Violência, Nádia Cardoso, e da assistente social do Crav, Daniella Cardoso.
À tarde, foi a vez de os estudantes receberem a trancista e criadora de conteúdo digital, Bruna Larissa, para uma conversa sobre o tema: “Cada Cabeça é um Mundo: a Expressividade da Mulher por meio dos Cabelos”.
Ambas as atividades resultaram de uma parceria que envolve a Secretaria Municipal de Políticas Públicas para as Mulheres, através do projeto “SMPM vai à Escola”, e a Secretaria Municipal de Educação, por intermédio do projeto multidisciplinar “Gerenciando Emoções e Sentimentos”, desenvolvido durante todo o ano letivo pela equipe da Escola Municipal Juiz Dr. Gildásio Castro.
Segundo a diretora da escola, Daniela Costa, as duas palestras foram concebidas de modo que os alunos aprendessem sobre diferentes abordagens das lutas pela equiparação de direitos de gênero e pelo combate ao sexismo – e, consequentemente, incentivá-los a transmitir esses conhecimentos a outras pessoas. “Lidar com esses sentimentos e essas emoções, é reportar para o nosso projeto de vida. Saber como se defender, como ir além e também como chegar junto da sua comunidade para poder fazer esse trabalho de prevenção, que começa na escola”, complementou a gestora escolar.
Reflexão e resistência
Na primeira palestra do dia, as representantes do Crav distribuíram materiais informativos e promoveram atividades interativas com os participantes, a fim de sensibilizá-los sobre assuntos como igualdade de gênero, empoderamento feminino e os direitos das mulheres. “Os alunos mostraram interesse e fizeram várias perguntas, demonstrando vontade de aprender mais sobre o assunto. Foi uma visita muito produtiva e deixou um legado de conhecimento e reflexão para as futuras gerações”, avaliou a coordenadora do Crav, Monique Cajaíba.
Na atividade vespertina, Bruna Larissa compartilhou com os estudantes uma contextualização histórica e social do uso das tranças pelo povo negro. Em seguida, falou-lhes sobre a liberdade que as mulheres têm para deixarem seus cabelos – ou a ausência deles – da forma como se sentirem mais autênticas e livres.
“Para nós, pessoas negras, poder expressar o nosso cabelo, usar nossas tranças, nosso black ou as mulheres que estão raspando a cabeça, é um ato político. É um ato de resistência. E eu poder falar sobre isso, é incentivar outras meninas a se sentirem livres para poderem se assumir, também”, afirmou Bruna, cujo trabalho pode ser visto no perfil Cachos da Bruna, no Instagram.
Liberdade
A estudante Thainá Gonçalves Santos, 16 anos, moradora do Henriqueta Prates, sente-se à vontade com seu cabelo crespo, dividido em tranças e preso num pequeno coque no topo da cabeça. “Eu uso no meu dia a dia, porque é muito confortável de fazer”, explica a adolescente, atualmente no 6º Ano do Ensino Fundamental.
No entanto, essa aparente naturalidade foi conquistada a muito custo, já que, assim como a maioria das mulheres brasileiras, Thainá se submeteu durante anos à lógica do alisamento capilar. A partir de 2019, ela optou por deixar que seus cabelos seguissem sua forma crespa natural. Mas, até chegar ao atual estágio de praticidade, ela passou pelo processo de transição, que durou dois anos e meio. “Comecei a fazer trança para o cabelo crescer. Eu sempre usava trança e touca, e também o coque, porque ajuda muito”, relembrou.
Quando perguntada sobre o porquê de ter tomado a decisão de enfrentar todo esse processo e assumir a naturalidade crespa de seus cabelos, Thainá responde com uma maturidade que pode parecer incomum entre as garotas de sua idade. “Eu acho que significa segurança para o meu dia a dia e para outras pessoas. E também essa afirmação de que, se você quer fazer isso, você faz. Não importa a opinião de ninguém, nem da sua mãe, nem do seu pai, nem de ninguém ao seu redor”, defendeu a garota.
Para Thainá, o conteúdo da palestra ministrada por Bruna Larissa significou “liberdade”, diante das distorções sociais que ela, conforme confidenciou, sente na própria pele. “É a liberdade da cor negra. Porque, muitas vezes, a gente anda na rua e ouve: ‘ah, olha aí, ela tá mal vestida’. A aparência importa, principalmente para uma pessoa negra, porque, se a gente olhar, o nobre é sempre o branco. As pessoas pretas sempre são mais pobres”, lamentou a estudante.
Autoestima e aprendizado
Outra estudante, Ketlyn Cristiane Silva, 14 anos, hoje cursando o 9º Ano e morando no Recanto das Águas, demonstrou um nível semelhante de consciência social e estética – o que, nesse caso, pode ter origem na convivência familiar. “Eu gosto muito do meu cabelo. A minha mãe também é trancista e eu gosto bastante dos penteados que ela faz”, contou a jovem.
Porém, Ketlyn afirmou que o significado de seu cabelo não se resume à beleza. “Pra mim, ele é importante, me deixa com autoestima. Eu me sinto super bem com ele”, vaticinou.
Quanto à palestra, ela apreciou o incentivo à coragem de se assumir os próprios cabelos em suas formas crespas, cacheadas ou penteados em tranças – ou, ainda, em outros penteados pelos quais as mulheres optarem. Ela própria conta que, tempos atrás, já sentiu medo de se apresentar com seus cachos naturais.
“Já tive muito medo, porque eu já passei por muitas coisas assim, mas não comento tanto assim”, disse a estudante. “Por xingarem, mesmo. Porque, hoje em dia, muitos são mal-educados, racistas e não respeitam os gostos dos outros”, complementou. Com a palestra, ela garantiu ter-se sentido confortada: “Agradou bastante, porque eu não sou de conversar sobre isso. Ninguém senta para conversar comigo e eu estou aprendendo sozinha”.